Geografista

Geografista

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Um fim, Re-começo. Um bacharelado, uma Licenciatura. Uma colega de curso, uma Amiga.Uma professora, Uma Geografia

Texto de uma Amiga que conquistei em mundo dificil que é o universitario. E que a alguns meses iremos "separar" por não vermos com tanta frequencia nos corredores Ueceanos.

A Geografia se propõe a algo mais que descrever paisagens, pois a simples descrição não nos fornece elementos suficientes para uma compreensão global daquilo que pretendemos conhecer geograficamente. As paisagens que vemos são apenas manifestações aparentes das relações estabelecidas entre os muitos e variados integrantes do nosso planeta e até mesmo do Universo. E durante quatro longos anos vivemos (ou tentamos viver isso no cotidiano).

Se inicia o 4x4. Último ano dos quatro anos mais intensos da minha (ou seria nossas?) vida, onde tudo se “iniciou com a luta que o homem trava com a natureza”. (IVAN, 2008)

Conhecer a Geografia e os caminhos que ela nos possibilita foi (é) o mais simplório vivido e descoberto por nós, afinal, é a proposta do curso. Entender o espaço geográfico foi além da leitura, além da referência bibliográfica, além do campo. Conhecer esse espaço foi conhecer a nós e nos explorar na medida em que íamos explorando a ciência, na medida em que íamos lendo sobre seus fundamentos e colocávamos o pé na estrada começamos a reconhecer nossos próprios fundamentos, nossos limites (?) e estreitando nossos laços. Fortificamos amizades a cada manhã passada ao lado, dividindo humores, risos e abusos. Compartilhamos as dificuldades e fragilidades da - nossa querida e sucateada - UECE, lotações, areias, mares, serra, precipitações, leves turbulências, lindos e calorosos pôr de sóis. Um sol mais lindo que o outro. Em paralelo íamos devorando e explorando a Fortaleza, que sim, é muito bela, ao longo de várias, várias, aulas de campo. E como foram muitas, seu SANTOS!

Com um gosto de saudade e um ponto de precipitação digito essas simples linhas com o intuito de registrar um pouco da nossa história fora dos muros do Itaperi e de encontro às fronteiras do mundo.
A primeira fronteira e a mais marcante de todas foi nossa primeira viagem juntos: Crato. Cratim-de-Açúcar, onde tudo começou e onde vivemos a certeza que aqueles laços de amizades seriam selados pra toda uma vida. Não da pra esquecer meu primeiro (de muitos) bandeijão, ao lado do meu Tesouro, tomando suco de cor; da quase (graças a Deus) morte do Paulinho na linda Cachoeira da Morte do pulo do De Jah do alto da mesma cachoeira os pés da Chapada do Araripe. Das voltas que eu dei em torno da bengala do Pe. Cícero que resultou numa reconfiguração da minha vida (ainda tenho que voltar lá pra dá as voltas contrárias).  Aos pés da Araripe que eu amei o Junior, o Paulo, a Cleide, o George, a Lai, o Leozim e tantos outros pela primeira vez. Foi aos pés da Araripe que nós enterramos (literalmente) um professor da URCA durante uma noite chuvosa com aventuras na cobertura, amanhecemos passeando de pijamas pela universidade, marchamos (vide bombeiros), tomamos café no Iguatemi do Crato e andamos de pau-de-arara. Isso sim é começar bem uma amizade. No retorno ao Fortaleza mais conhecimento foi construído. Mais mesas sociais foram encorpadas ao nosso cotidiano.

Graças a Geografia redescobrimos o Maciço de Baturité e vimos o pôr do sol mais colorido do mundo - no Lameirão – e degustamos a comidinha da D. Fátima (mãe da Coração). Em experiência pessoal descobri que depois de um fim de semana regado a vinho, uma dose de tequila (ainda bem que o Léo não tem facebook), e cerveja (muita cerveja), a culpa da ressaca é sempre do gelo. Descobri que o maciço tem muito cheiro de café e Mata Atlântica. Destaque especial pra Mulungu: uma cidade fashion com sua delegacia rosa, um cemitério no alto da serra com uma espécie de mirante. Vai entender...
E na medida em que a memória vem sendo refrescada vai batendo a saudade ...
Saudade de “se passar” na Cuesta da Ibiapaba, tomando cachada medicinal e dançando forró na Bardega do Didi pra esquentar o corpo e amenizar o frio.  Dormir, acordar e botar o pé na estrada rumo aos 40ºC (na sombra) de Sete Cidades. De parar no meio da BR pra tirar foto. De ouvir a musica da Mineralogia e a paródia da Geografia. Licores e bondinho. Fiukeeeeeeeee!

E na volta aqueles lindos comentários, aqueles risos tão gostosos e a ânsia de viver mais momentos juntos. Mas, para nós, nada seria tão bom quanto aquela Ibiapaba. 

Ai pensando que tudo já era muito bom e gostoso ... somos presenteados por um campo percorrendo todo o Litoral Leste e  Canoa Quebrada! Que dias! Que noites! Que madrugadas! Que vinho! E o Casal! Aprendi que vinho combina demais com Zezé de Camargo e Luciano, Raça Negra e axé, mas não combina com subir escadas da Europa depois de uma noite na Broadway. Isso não é uma coisa muito inteligente. Um abraço especial pro Paulinho e pro Leandro Russo. Tememos os Viking e visitamos minha mansão na Foz do Jaguaribe exatamente ao lado do farol de Fortim. Plantamos uma floresta de limão, secamos a agua do mar até formar uma montanha de sal e abrimos um rio de tequila no Rio Grande do Norte.
Saltos meteoricos, paixões avassaladoras, desilusões, inicio e fim de ciclos até que chegamos ao Maranhão mostrando o que é que o cearense tem. Uma viagem única a começar pela ida (lembra, Lai, que eu acordei achando que estava a caminho do Crato?). Maranhão esse onde dançamos, brincamos, conhecemos, aprendemos e frequentamos lugares que nunca imaginamos (aquele bar derrubado, no qual a anã era dançarina). Fomos estrelas, minha gente!  Nunca pensamos que nos sentiríamos tanto na Bahia como na Ilha do Amor e do reggae. Dias lindos! Conhecimento de pessoas massas desse Nordeste em nossas caminhadas até a Litorânea. No percurso até Lençóis pulando na jardineira e gravando vídeos pra Carla e cantando moda de criança em várias línguas enquanto todos dormiam. Andar por horas no deserto de sol forte, pra chegar a lagoa dos Lençóis e ... dormir. Sim, dormir. Eu e a Laiana dormimos sob uma sombra enquanto todos se maravilhavam com aquele mundão de areia. Saudade de ser conhecida no Nordeste todo como “Menina do Tesouro”. Saudade de ir pra cima e pra baixo com os baianos, saudade de dançar com os mesmos. Saudade. E do Maranhão nós levamos o desejo de conhecer Salvador. De ser da Bahia. De querer a Baêa.

Antes dela fizemos um campo extra-ordinário: Jericoacoara, minha gente! O que foi aquele nosso fim de semana? Sombra, água fresca, lagoa de aguas cristalinas e mais jardineira. Ficar acordado até às 3h da madrugada pra comer o melhor pão do mundo não tem preço “hohohohohohoho”. Abraçando o Darllan e sua esperteza. Como era gostoso acordar naquele lugar feio com a turma da Malhação e os Lost. (Aquele abraço pra essa turma do bem).

Mais dois meses e  ... Ah! A Bahia! Com suas surpresas e engarrafamentos. O axé que nós tanto procurávamos não achamos, mas achamos sorrisos da Barra a Ondina. Achamos amores. Achamos Mamãe Oxum no Tororó. Reconhecemos a geografia da Copa do Mundo e o quanto às obras de mobilidade urbana se faz necessárias. Achamos o Pelô, a punhetinha e o Jorge. Ah! O Jorge, como é Amado. Mas faltou o tão desejado axé. O tão sonhado ensaio do Olodum nas ruas do Pelô. Faltou a Terça da Benção. Decidimos que SSA merece uma segunda chance e na volta deveremos levar redes e coisas pra fazer na madrugada.
Do ultimo campo pra cá são três meses. Já sinto falta das viagens forjadas: vide Jericoacoara.  Já sinto falta das minhas brigas homéricas (ainda bem que o Léo não tem facebook – Parte 2). Falta das aulas tão bem assistidas e participativas no Corredor Central. Das tardes tão produtivas no LCDG vendo Almodóvar com o Alê, Haka com a Laiana. Rindo. Jogando conversa fora e pensando na arte ... pq nem só de Geografia se vive um geógrafo.  Saudade de dançar forró no Elefante Branco. Da socialização com o Serviço Social, Ciências Sociais, Biológicas, MedVet, História, Pedagogia, Ed. Física e Adm. Saudade até do tio da tapioca e da Ueceana. Saudade de bater o ponto no Society. Saudade de comer farofa e jogar Uno na casa da Tia Mirmia. De feijoada noturna. Da comida do Roxael (xiitas me crucificando?). Das conversas com o Firmino e do orgulho imenso que eu tenho dele. Do Pepe. De olhar pro Ailton e ouvi-lo dizer o quanto eu sou enjoada. Dos abraços espremidos do jeito que só o Hangley sabe abraçar. Saudade de quando o Renato era nosso contemporâneo. Das frases desbocadas da Carla. Saudade do anexo do Bloco G e das vezes que os 

professores nos mandavam calar. Saudade de ...

“Às vezes no silêncio da noite ... URUUUU! Aplausos!” 

Saudade cheia de orgulho por ter vivido com vocês. De ter amado vocês. De amar vocês.  Até da UECE eu já sinto falta. De Tete, de Gêmea, de Coração e Graveto.

Aprendemos a experimentar. Aprendemos a eliminar o preconceito de rock branco, rap verde, forró azul. É musica. É gente. E temos que aproveitar a vida e explorar os sentidos. De tudo levamos muito. Deixamos muito. Crescemos mais ainda. A certeza que temos é que além de conhecimento geográfico - e de licenciados - é que saímos da UECE mais humanos. Não meros professores de geografia.  Saímos da UECE mais sensíveis às dificuldades sociais e inquietos com as desigualdades. Há quem vá dizer que não, mas depois desses quase quatro anos, é impossível sermos os mesmos. Impossível termos as mesmas visões e sermos menos politizados. Rumo à vida lá fora. Rumo a mais aventuras e que essas aventuras nos mantenham unidos, firmes e fortes na amizade. Obrigada pelos três mais lindos, felizes e intensos anos da minha vida. Obrigada por acompanharem minha evolução, minhas mudanças mais simples e meus rompimentos mais dolorosos. Obrigada pelas lágrimas secadas e compartilhadas. Pelos risos. Pelas cervejas.

Da UECE e dos anos de Geografia no Bloco G levamos uma bagagem intensa de experiências e conteúdo. Sairemos bons entendedores de Espaço, geomorfologia, questões urbanas e ambientais, de cerveja, Haka!, carnaúbas, vendedores de cosméticos, professores e divulgadores de saber. Transmissores de cultura útil e inútil adquirida entre aquelas paredes. Saímos de nossos armários pessoais (sem o Mário, pq esse nos deixaria lá pra sempre) e experimentamos sabores, danças, sons. Exploramos os cinco sentidos com toda a intensidade que nos foi proposta e em alguns momentos superando até mesmo nossas limitações humanas.
Fim de conversa e lá vamos nós às monografias, as últimas viagens como graduandos e as ultimas e esperadas horas/aulas com a droga de um N na titulação (temporal claro).  E sim, amo vocês!




REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
PESSOA,Nayana. Facebook, Notas.2012

sábado, 18 de fevereiro de 2012

O indivíduo, a sociedade e a morte de Eloá

Mais de três anos depois do espetáculo televisivo produzido pelo cárcere seguido de morte de Eloá Pimentel, com apenas 15 anos de idade, a mídia se volta novamente para o caso dando fôlego, às mais diferentes teses sobre o comportamento do jovem rapaz, Lindemberg Alves, em julgamento há três dias. Por um lado, o psicopata, decepcionado e louco de amor; por outro, a caricatura do Romeu arrependido, sofrido e que esbravejou, também, em tom de loucura, que amava e queria Eloá. Em ambos, o amor ou o que se pensa sobre o amor delineia o tom e encobre o que, de fato, devemos debater. Definitivamente, não foi o amor que matou Eloá.

As análises do caso se voltam, quase que completamente, para o comportamento do jovem agressor. O assassinato é tomado por uma áurea de debate comportamental individual, com privilégio total e absoluto, das provocações subjetivas para que alguém possa ter cometido tamanha atrocidade. Em nenhum momento, os policiais, psiquiatras, psicológos, advogados.... convidados, pelos apresentadores de programas populares ou não, ao tratar do caso em rede nacional, levantaram questões acerca do que elaboramos sobre: sociedade patriarcal, machismo, violência de gênero, feminicídio, banalização midiática da violência.. para falar dos pontos que mais vem merecendo produção feminista, na academia e na política.

Não há problemas nem teóricos, nem políticos; nem muito menos midiáticos em discorrer sobre o indivíduo. Muito pelo contrário, há muito que as ciências humanas compreendem e elaboram a existência do indivíduo. No entanto, há muito, também, que as mesmas ciências humanas, ao elaborar sobre a relação indivíduo/sociedade, defendem que não devemos tomá-la de maneira maniqueísta ou absolutizar, de forma tuteladora, o que convencionamos chamar de social ou individual.

Falo sobre isso, pois, o machismo é um fenômeno sócio-político-cultural mais compreendido como genético que eu conheço sob a face da terra. De tão arraigado, parece estar presente no DNA de homens e mulheres. O machismo não paira no ar; nem corre no sangue de ninguém. É real, material e identitário e se mostra, em toda a sua concretude, por meio de comportamentos - individuais ou não; que se expressam dentro e fora de casa; nos espaços públicos e privados; nos partidos, nas igrejas, no estado. O machismo estrutura e é estruturado pela sociedade.

Nos comportamentos machistas, analisados, apenas, por sua "matriz" individual, o que mais aparece são as teses sobre posse, honra e ciúmes. Ora, ora... já desbaratamos que posse, honra e ciúme - repito - não são "amor" e não contribuem, em nada, para garantir uma boa relação afetiva. Nem para apimentá-la, como muitos preferem. Esta tríade potencializa a feição mais tragi-romântica das chamadas histórias de amor e são cantadas pela mídia, cotidianamente, nos casos mais famosos e nos mais anônimos.

Lindemberg não estava decepcionado amorosamente; decepcionados ficam qualquer um de nós quando levamos um “fora”. Ele estava inconformado com a decisão de Eloá em terminar a relação, que tudo indica, já tinha indícios de violência seja física, psicológica ou moral. A mídia, em sua versão conservadora, e graduados da ciência não tinham – e continuam sem ter - o direito de fazer dela, algoz ao ter se recusado a "dialogar" com o moço trabalhador, jovem e sofrido. Por ter assassinado Eloá, Lindemberg não deixa de ser nem jovem, nem trabalhador, nem sofrido, nem psicopata – se for o caso. Mas, estas características, que também tem expressão individual e social, não inibem o machismo e suas múltiplas feições, comportamentos, inclinações ou quaisquer nomenclaturas que o valham.

Não defendo nenhuma forma de exposição pública de Lindemberg. De maneira alguma. Ele precisa ser julgado, com base nos princípios de direitos humanos, e condenado para que este não seja mais um caso - dentre tantos outros – impunes pelo Estado e pela mídia. Ele, assim como muitos (muitos, mesmo) homens, jovens ou não, também são vítimas (e fazem vítimas), em diferentes graus, por conta do machismo, do homofobismo e do racismo. Mas, o Estado, neste caso, prioritariamente, o poder judiciário, não pode se pautar (e potencializar) a vertente institucional do machismo que violenta ainda mais as mulheres, em especial as mais jovens e pobres, que são as que mais permanecem em relações violentas por medo do ponto crítico da violência: a morte.

Neste caso, especificamente, resta saber, sob quais condições Lindemberg será julgado e condenado. Chegou a hora, mais uma vez, de acompanharmos o comportamento do Estado. Pois, o destino de Eloá já é conhecido. Ela morreu muitas vezes ao longo de todos os dias em que seu desespero foi exposto frente à imobilidade do Estado e da sociedade brasileira; morreu quando foi julgada por não querer o “amor” de Lindemberg; morreu quando foi culpada por ser tão bonita – “a mais bonita da escola” – e não ter querido dialogar com um rapaz tão apaixonado; morreu quando teve sua vida interrompida por tiros de revólver em sua virilha e rosto, que atingiram sua identidade e sua sexualidade, numa profunda declaração de domínio e controle sobre o corpo e a vida das mulheres.

Mas, Eloá vive! Vive na luta que travamos todos os dias; vive na alegria que vamos levar para avenida no carnaval de Fortaleza; vive em nossas meninas e meninos que queremos que tenham uma vida livre de todas as formas de opressão e violência, no presente e no futuro. Vive, pois não abriremos mão de nossa identidade feminista, de fazer política e de contribuir para a construção de uma outra sociedade. Lutemos em nome dela, por nós e por cada uma de nós!

domingo, 12 de fevereiro de 2012

O que significa ser Primeiro Mundo?

O Brasil viveu as primeiras semanas do ano saboreando os resultados da pesquisa, divulgada nos últimos dias de 2011, que o colocou junto às nações mais endinheiradas do planeta. Com méritos, avançamos à condição de oitavo para sexto maior Produto Interno Bruto do mundo, segundo levantamento feito pelo Centro de Pesquisa para Economia e Negócios do Reino Unido.

O problema é que o desenvolvimento é um poliedro do qual o crescimento da economia é apenas uma das suas múltiplas faces. Mesmo que fosse diferente, aliás, recomenda-se humildade neste quesito. Estamos na poeira das grandes economias em outros indicadores.

Vejamos o motivo: outro levantamento – desta vez feito pela organização internacional Oxfam – situou o Brasil na modesta 17ª posição entre as nações com melhor distribuição de renda do planeta. É pouco para quem quer ser grande, de direito e de fato.

Mas não é de desenvolvimento econômico que trataremos neste artigo. Nosso foco é outro: a dimensão humana, sóciocultural, do Primeiro Mundo. Em uma palavra: civilidade.

Vamos ao ponto, sem rodeios: neste campo, como no da economia, ser o sexto PIB do planeta não torna o Brasil plenamente desenvolvido, de verdade. Diferentemente do que pensamos, não é apenas no campo da Educação formal que nossa civilidade caminha sobre cristais.
É no cotidiano das ruas que as facetas da rusticidade, do oportunismo, e do mais arraigado macunaísmo imprimem sua marca mais contundente. E ao fazê-lo, no caso brasileiro, denuncia a exaustiva maratona que temos pela frente na superação da ignorância, que – entre outros aspectos – nos impede de sermos chamados de país de Primeiro Mundo.

Ignorância do cliente que fura fila na agência bancária. Do motorista que não espera a travessia dos pedestres, na rua. Do usuário do transporte coletivo que não cede seu assento a um idoso, no ônibus. Do glutão que suja a rua com embalagens de comida. Do fumante que se compraz em exercer seu vício em lugares onde o tabagismo é proibido.

Note: nenhum dos exemplos acima têm a ver com vandalismo. São pequenas molecagens cometidas por seres humanos aos quais faltou não exatamente escola, mas provavelmente berço e boas companhias – o que se traduz na presença de pais e amigos responsáveis a lhes dizer qual o caminho certo a seguir, garantindo-lhes o direito de merecer o título de cidadãos. Gente assim é exceção à regra, sem dúvida. Mas quando uma exceção se torna extremamente comum, como no caso brasileiro, deixa de ser exceção. Vira quase consuetudinária. Um hábito de péssimo gosto.

Testemunhamos situações didáticas em outros países. Na Alemanha, no trem que liga Munique a Füssen, um senhor chamando a atenção de uma criança que jogou uma embalagem de bala no chão limpíssimo da composição. Em Bruges, um morador local advertindo um turista apressado que havia desafiado o semáforo, vermelho para pedestres. Em Praga, usuários do transporte coletivo validando bilhetes de metrô, mesmo tendo a possibilidade de passar por catracas livres.

Não falamos de nenhum Éden habitado por anjos sem asas, de carne e osso. A Alemanha, lembre-se, foi o berço do nazismo. A Bélgica, um cruento colonizador do século XIX – país que, aliás, vive uma das maiores crises da sua história, com milhares de pedintes e desempregados nas ruas. E Praga se divorciou do autoritarismo do antigo regime de Estado há menos de vinte anos.
Portanto, os exemplos acima não significam que alemães, belgas e tchecos sejam monges budistas e, nós, hunos tropicais. Quadros crônicos de corrupção e desonestidade são comuns lá, tanto quanto cá.

O Brasil tem muitos exemplos a dar ao mundo, sem dúvida, inclusive no campo ético. Logo, não somos piores e nem melhores que os países desenvolvidos. Somos apenas diferentes nas nossas singularidades. O problema é que, em muitas situações tão comuns no nosso cotidiano, somos muito diferentes porque ainda não aprendemos a respeitar o outro nos ambientes comuns que dividimos, tanto quanto a nós mesmos, como se faz em certas nações que aprenderam esta preciosa lição.

O esclarecimento é importante para antecipar uma resposta aos já previsíveis ataques que receberemos dos pouco esclarecidos, que rotulam de impatriotismo (ou servilismo às nações mais desenvolvidas) toda crítica ao Brasil. Não entendem que a maior prova de amor é a crítica construtiva.
Nenhuma grande Nação do planeta alçou esta condição escondendo seus esqueletos em meio a grossos cobertores, nos armários.

Só se atinge um patamar de desenvolvimento efetivo assumindo corajosamente os próprios erros e executando com obstinação uma correção de rumos em todos os campos, começando pelo ético e o cultural. Seguindo, enfim, a recomendação do nosso maior antropólogo, Roberto da Matta, quando critica a confusão que fazemos entre o ambiente público (onde temos que respeitar o outro, privilegiando o interesse coletivo) e o privado (onde podemos fazer o que quisermos, privilegiando o interesse individual) na magistral obra “A Casa e a Rua”.

Não se espere que o governo, de forma paternalista, faça isso por nós. Aprendamos com Confúcio: “O homem superior atribui a culpa a si próprio; o homem comum aos outros”. A mudança em direção a um ambiente no qual haja respeito ao outro tem que começar dentro de cada brasileiro. Primeiro, em casa; depois, nas ruas, onde exercemos nossa civilidade de forma plena. Isto é ser Primeiro Mundo. O resto é conversa de boteco.


http://www.cartacapital.com.br/economia/o-que-significa-ser-primeiro-mundo/#.TzdAtiDRHAw.facebook

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Onde está a segurança e a insegurança no Brasil

No Brasil não há crise segurança para o sistema do capital, para as finanças, para os bancos, para os credores da dívida pública, para os poderosos que se cercam de seguranças privados.
Mas não há segurança para aqueles que são responsáveis pela segurança pública: os policiais militares. Pelo fato de não terem a segurança de um salário decente, de condições de trabalho adequadas e de trato digno por parte do poder público se rebelam como aconteceu neste ano no Ceará e agora na Bahia. Com os humilhantes salários que recebem, pouco mais de dois mínimos, que segurança podem dar a suas famílias que tem que pagar aluguel, escola, transporte, luz, agua e alimentação?

A responsabilidade maior pela insegurança pública que se instalou em razão da greve dos policiais militares, com assassinaatos e depredações, deve ser tributada principalmente ao poder público que não soube ouvir e dialogar de verdade e não retoricamente, antecipando-se aos fatos lamentáveis.
Que diálogo e negociação são possíveis e criveis quando se responde com a arma da violência, pondo militares contra militares? É uma estratégia da ignorância política e da prepotência, totalmente ineficaz porque agrava ainda mais o problema em vez de encaminhar uma solução. Por que não se aprova a PEC 300 que estabelece o piso salarial dos policiais militares? Os governos federal e os estaduais se uniram para protelá-la e esvaziá-la.

Usem os 60 bilhões de reais, subtraidos do orçamento, para aumentar os salários deles, ao invés de dar segurança aos credores! O que conta mais, as pessoas, os policiais militares e suas famílias ou os dinheiros dos ricos epulões? Esse dinheiro é do povo para servir ao povo, garantindo-lhe segurança confiável e respeitosa. Seguindo esta indicação do bom-senso se acabam as rebeliões e os policiais terão a paz e o sossego necessários para desempenhar com sentido público e com honradez a sua alta e arriscada missão.

Artigo publicado no Jornal do Brasil digital de 6/2/2012

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Afinal, as ruas são para quem?

Por que eventos que atraem multidões são quase sempre vistos como um problema para Fortaleza? Longe de ser uma questão que dê conta de um tempo presente, a pergunta tenciona um dos dilemas de uma cidade que não para de crescer 

No fim de semana passado, os principais blocos de Pré-Carnaval da Praia de Iracema ameaçaram não sair às ruas. Segundo noticiado pelo O POVO na quinta-feira (26), os organizadores reclamavam do baixo efetivo de policiais militares e guardas municipais durante os cortejos. A precariedade na segurança favorecia assaltos, furtos, ataques a veículos, agressões e inclusive arrastões. A principal fonte dos tumultos seriam as gangues que se formavam em torno dos paredões de som, proibidos por lei municipal. “Temos medo de acontecer uma desgraça; morrer uma pessoa”, ponderou o vocalista do Unidos da Cachorra, Haroldo Guimarães.

Após reunião entre a Secretaria de Cultura de Fortaleza, a Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e de Cidadania (AMC), o Comando de Policiamento da Capital e os representantes dos blocos, o possível boicote foi cancelado. A Polícia Militar comprometeu-se a aumentar o número de seus efetivos. A Secretaria de Meio Ambiente e Controle Urbano (Semam) prometeu ampliar de duas para três as equipes de fiscalização no trecho dos cortejos. “Agora a gente clama para que os foliões apareçam porque vai ser mais seguro”, comentou Tiago Nóbrega, da diretoria do Camaleões do Vila, para O POVO, na sexta-feira (27).

Não é a primeira vez que um evento cultural de multidões é ameaçado em Fortaleza. O Pré-Carnaval da Praça Martins Dourado (Pracinha do Papicu) não acontece este ano, após negociação entre moradores. Alguns blocos célebres foram extintos por atrair excesso de público, como é o caso do Quem é de Bem Fica, nos anos 1990. Outros mudaram de endereço. O Concentra, Mas Não Sai precisou transferir sua festa do Mercado dos Pinhões para a Praça do Ferreira por não conseguir controlar a contento a multidão de foliões.

Também é importante frisar que o Fortal foi proibido de ser realizado na avenida Beira Mar por decreto municipal, em 2004, que apontava inúmeros transtornos na área da micareta. A produção do Fortal conseguiu autorização do Supremo Tribunal de Justiça para sua realização nas proximidades do aterro da Praia de Iracema. No ano seguinte, o evento foi transferido para a Cidade Fortal, onde permanece com controle maior da segurança dos foliões.

Nos anos 1970, as procissões para Iemanjá cresceram tanto que cerca de 20 mil pessoas acompanhavam a manifestação. Na década seguinte, a festa se consolidou na Praia do Futuro, com a promessa de uma estátua em homenagem a Iemanjá, que nunca foi construída. Com o crescimento das comemorações à padroeira Nossa Senhora da Assunção no dia 15 de agosto, diminuíram as atenções à Festa de Iemanjá. “A multidão espontânea dos anos anteriores desaparece. A festa fica entregue à onda dos arrastões. O grande problema é a falta de segurança”, explica o antropólogo Ismael Pordeus Jr.

Os bailes funks que se fortaleceram em Fortaleza na década de 1990 foram proibidos em 2001 pela Polícia Civil, que identificava recorrentes confrontos entre gangues rivais. A interdição aconteceu na semana em que iria se apresentar na cidade o Bonde do Tigrão, um dos grupos de funk mais famosos da época. No caso dos estádios de futebol, a decisão recente pela torcida única no Clássico-Rei do Campeonato Cearense 2012 também reflete o temor da diretoria em relação à violência que as aglomerações de torcidas diferentes podem causar.

Mas será que multidão é sinônimo de instabilidade? Por que eventos que atraem milhares de pessoas são vistos quase sempre como um problema para Fortaleza?

ARTIGO PUBLICADO PELO JORNAL "O POVO" A RESPOSTA NA PROXIMA POSTAGEM.!

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

http://www.opovo.com.br/app/opovo/vidaearte/2012/02/04/noticiasjornalvidaearte,2778128/o-problema-das-multidoes.shtml